O que acontece ao nosso cérebro quando bebemos com amigos?
Usando moscas da fruta, estudo realizado nos Estados Unidos mostra como o consumo social de álcool aumenta a euforia.
Se tomar uma bebida com os amigos numa happy hour, é provável que se sinta conversador, amigável e animado. Mas se tomar uma bebida sozinho, pode sentir-se deprimido. Os investigadores da Universidade do Texas em El Paso (UTEP), EUA, pensam que sabem agora porque é que isto acontece.
“Os contextos sociais influenciam a forma como os indivíduos reagem ao álcool, mas não existe nenhum estudo mecanicista sobre como e porquê isto acontece”, afirma Kyung-An Han, bióloga da UTEP, que utiliza moscas da fruta para estudar o alcoolismo.
Han e uma equipa de professores e estudantes da UTEP deram um passo fundamental para a compreensão do processo neurobiológico subjacente ao consumo social de álcool e da forma como este aumenta a sensação de euforia.
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O seu estudo, publicado em junho de 2024 na revista Addiction Biology, identifica a região do cérebro que é estimulada pelo consumo social de álcool e pode levar a uma melhor compreensão da forma como os seres humanos se tornam vulneráveis à Perturbação do Consumo de Álcool (AUD), uma doença que afetou cerca de 29,5 milhões de pessoas só em 2023, nos EUA, de acordo com o Instituto Nacional de Abuso de Álcool e Alcoolismo.
Acontece que as moscas da fruta embriagadas não são assim tão diferentes dos humanos intoxicados. Embora possam parecer uma escolha pouco convencional para obter conhecimentos sobre o comportamento humano, estes insetos partilham cerca de 75% dos mesmos genes que causam doenças humanas, explicou Han.
Reações diferem consoante ambientes
Utilizando moscas da fruta, Han e a sua equipa procuraram demonstrar que o etanol, o álcool presente nas bebidas, provoca reações diferentes em ambientes solitários e em grupos e que a dopamina, a molécula cerebral que desempenha um papel no prazer, na motivação e na aprendizagem, é um elemento-chave para este fenómeno.
As experiências da equipa consistiram em expor as moscas da fruta, sozinhas ou em grupo, ao vapor de etanol e medir a sua velocidade média para determinar o grau de resposta induzida pelo etanol. Enquanto as moscas que “bebiam sozinhas” apresentavam um ligeiro aumento do movimento, as moscas expostas ao etanol em grupo apresentavam um aumento significativo da velocidade e do movimento.
A equipa testou então se a dopamina desempenha um papel na resposta das moscas ao etanol, comparando um grupo de controlo cuja dopamina era naturalmente regulada pelo cérebro com um grupo experimental que tinha níveis aumentados de dopamina.
A equipa descobriu que as moscas, independentemente de terem níveis normais ou aumentados de dopamina, tinham uma reação semelhante ao etanol num ambiente solitário – um pequeno aumento de atividade. Mas em ambientes sociais, as moscas com níveis aumentados de dopamina mostraram uma hiperatividade ainda mais elevada do que o habitual.
“Demonstramos que tanto o ambiente social como a dopamina atuam em conjunto na reação elevada das moscas ao etanol”, afirmou Han.
A tarefa final da equipa foi identificar qual dos cinco recetores de dopamina no cérebro é o que mais contribui para este processo e descobriu que o recetor de dopamina D1 era o mais importante para a reação das moscas ao etanol num ambiente social.
“O gene humano do recetor D1 está ligado à perturbação do consumo de álcool e este estudo fornece uma validação experimental para o mesmo. Para a equipa, a identificação do recetor D1 é crucial, pois dá aos investigadores da UTEP e de outras instituições um modelo para estudos de acompanhamento”, explicou Han.
“O nosso trabalho está a fornecer conhecimentos científicos que apoiam a ideia de que o cérebro interpreta e processa o ambiente social de uma pessoa e faz convergir esse sinal para o sistema dopaminérgico, que também é ativado pelo consumo de álcool”, afirmou Paul Rafael Sabandal, professor assistente de investigação em ciências biológicas e um dos autores do estudo. “Isto dá-nos, enquanto investigadores, uma ideia da área cerebral e dos componentes que podem servir de ponto de encontro para todos os sinais que contribuem para o AUD.”
O próximo passo da equipa é explorar os meandros pelos quais o recetor D1 da dopamina serve de ponto de ligação para os sinais que contribuem para o etanol, a interação social e o AUD.
