O meu filho não come. Devo obrigá-lo, castigá-lo ou recompensá-lo se comer?
É comum que o apetite das crianças em idade pré-escolar diminua. No entanto, é necessário que os pais estejam atentos a esta alteração de comportamento e adotem estratégias a favor da alimentação e não estratégias que promovam a insistência exagerada, a punição ou o castigo.
A seletividade ou recusa alimentar nas crianças tem consequências, tais como, o desenvolvimento de défices nutricionais, dificuldade em frequentar lugares que não ofereçam alimentos aceites pela criança, desenvolvimento de uma má relação com a comida, culpabilização dos pais por parte da criança por estes não a entenderem e a longo prazo a dificuldade da criança em lidar com os momentos de refeição pode contribuir para a existência de distúrbios do comportamento alimentar.
Tendo em consideração que o objetivo das refeições é proporcionar momentos agradáveis, sugiro-lhe algumas estratégias a adotar:
Dê o exemplo
Se a criança observar o que os pais comem, irá ter uma maior tendência para provar o que lhe oferecem. As refeições em família são de extrema importância para a criação de experiências positivas alimentares. Por exemplo, se os pais não comerem sopa, será mais difícil incentivar a criança a comer esse alimento.
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Introduza os novos alimentos progressivamente e de forma combinada
Se a criança recusar um alimento, opte por oferecer outro alimento da mesma categoria nutricional. Combine os alimentos preferidos da criança com alimentos menos aceites. Por exemplo, juntar legumes triturados (cenoura, cogumelos, tomate) ao molho da bolonhesa.
Seja criativo. Introduza os novos ou antigos alimentos rejeitados de forma atraente. Aposte no empratamento e na forma divertida como combina e transforma os alimentos em bonecos, paisagens, flores, árvores, animais. Utilize pratos, copos e talheres atrativos e coloridos para que estimulem o interesse da criança.
Pode ainda alterar o local em que realiza as refeições, experimente fazê-las num tapete, recriando um piquenique na varanda, ou até mesmo num jardim ao ar livre. Tendo sempre em consideração que o local das refeições deverá ser tranquilo e sem tecnologia para que as crianças se foquem no comportamento alimentar.
Promova a participação da criança na preparação e escolha dos alimentos
Elabore a ementa semanal ou diária com a criança. Convide-a a ir consigo ao supermercado fazer as compras dos ingredientes que escolheram e incentive-a na preparação e confeção dos mesmos.
Estabeleça horários fixos e com intervalos definidos para as refeições
Se os alimentos forem oferecidos quando a criança tem fome, terão maior probabilidade de serem aceites. As refeições não deverão exceder os vinte a trinta minutos.
Incentive a criança a criar um diário de emoções alimentares
O objetivo é que a criança descreva o que sente ao comer cada alimento. Pode colocar uma coluna com desenhos ou imagens dos alimentos e do lado oposto colocar smiles que representem as emoções nojo, alegria, tristeza ou raiva.
Peça para que a criança descreva o novo alimento experimentado
Pergunte-lhe pela temperatura, saber e textura do alimento em vez de questionar se gostou ou não do alimento. Assim, estará a promover o desenvolvimento do paladar e a estimular os sentidos utilizados na alimentação.
Promova o contacto com a alimentação de forma lúdica
Leia histórias, faça jogos, veja filmes com a sua criança sobre alimentação, sobre a produção dos alimentos e sobre a forma de confeção.
Por outro lado, existem comportamentos que prejudicam a introdução de novos alimentos e o estabelecimento de uma boa relação com a alimentação. Assim sendo, partilho consigo algumas estratégias a não adotar:
Não obrigue. Obrigar uma criança a comer, não altera para melhor a relação que a mesma tem com o alimento. Deverá ter paciência e ser perseverante. É um processo longo, não desista de oferecer sem antes tentar várias vezes em dias e situações diferentes. Pode deixar de oferecer o alimento que está constantemente a ser recusado, mas deve continuar a consumi-lo ao pé da criança para que ela desperte o interesse por si própria. Quanto maior pressão sentir a criança, maior será a sua resistência ou o seu retrocesso no processo.
Não castigue. O castigo ou a punição reforçam o comportamento negativo. Se a criança se recusar a comer, deve retirar o prato de comida, sem fazer comentários, permitir que ela saía da mesa e na próxima refeição ofereça um alimento igualmente nutritivo.
Não recompense. Evite frases como “Se comeres a sopa, ganhas uma sobremesa”. Estas afirmações subestimam o valor da sobremesa e desvalorizam o valor da comida saudável.
Restrinja o consumo de líquidos durante a refeição. O estâmago das crianças fica rapidamente cheio.
Limite a oferta de snacks ou petiscos. Se a criança “petiscar” durante os intervalos das refeições principais, é natural que não tenha fome quando chega realmente a hora definida para se alimentar. Se a criança não quiser comer à hora do almoço ou jantar e passado uma hora pedir bolachas, seja firme e diga-lhe que se quiser comer, a hora do lanche está a aproximar-se e ofereça-lhe alimentos nutricionalmente saudáveis. Desta forma a criança irá entender que se recusar a comer o almoço, não irá existir uma troca por alimentos menos saudáveis.
Não compare. Se a criança recusar determinado alimento, não a incentive a experimentá-lo porque a criança x o experimentou, principalmente em sítios públicos onde a criança se pode sentir envergonhada e humilhada.
Evite brincadeiras como “o aviãozinho”. A criança não deve ser distraída com um brinquedo ou com tecnologia para se alimentar. Esconder ou disfarçar os alimentos não promove uma boa relação com eles.
Lembre-se, a hora das refeições deve ser um momento agradável para toda a família. A relação positiva com a alimentação, influencia a existência de apetite. Seja paciente, consistente e flexível. Foque-se em a respeitar o tempo de cada criança e a aprender a ler os seus sinais de fome ou ausência da mesma.
Por Marta Torres
Psicóloga clínica